Vamos por partes.
Falar sobre a percepção dos outros, implica tomar uma decisão: falar sobre a percepção que eu tenho dos outros, ou sobre aquela que os outros têm de mim?
A abordagem fará toda a diferença. Não apenas no discurso, mas também na percepção que de mim terá quem me ouve.
Se me centrar na percepção que os outros – vocês! – têm de mim, poderá parecer um discurso algo narcisista e egocêntrico. Mas se me detiver na percepção que eu tenho dos outros, corro o risco de parecer arrogante.
O melhor será, talvez, focar-me no abstracto. Não quero gerar más percepções.
A verdade, é que temos em nós a ideia de que somos seres absolutamente singulares. Mas – pasmem-se – não somos! Somos sempre dois: o eu e o outro.
Eu, apenas e só para nós próprios. O outro para todos aqueles que connosco inter-agem. E perante este facto inegável, fica demonstrada a teoria de que todos nós sofremos de dupla personalidade. Resta apenas saber até que ponto temos essa consciência.
Está provado que são precisos apenas 30 segundos para formarmos uma opinião sobre alguém que acabamos de conhecer. A forma como se apresenta, como nos cumprimenta, como se veste, como fala, tudo contribui para que inconscientemente coloquemos esse indivíduo numa determinada categoria. Categoria essa construída por nós, pela experiência que temos, pela pessoas que fomos conhecendo ao longo da vida, pelo facto de existirem comportamentos recorrentes em pessoas com determinadas características. Ou, pelo menos, essa é a nossa percepção. E essa ideia que construímos, certa ou errada, irá condicionar toda a nossa atitude perante esse outro, pelo menos até (nos) darmos a oportunidade de deixar de o encarar como um simples outro e passarmos a encará-lo como um eu.
Um eu singular, dono dos seus valores, das suas convicções, do seu livre arbítrio. Dono das suas decisões, tão legítimas quanto as nossas, mas que podem muitas vezes não ir ao encontro daquilo que seriam as nossas escolhas.
Quão mais fácil seria a vida se tivéssemos a capacidade de nos pormos no lugar do outro em todas as circunstâncias? Quantos problemas evitaríamos? Quantos mal-entendidos deixariam de existir se percebêssemos que afinal, pode não haver uma maneira certa e outra errada de agir? Que pode haver apenas uma maneira diferente, mas igualmente válida, daquela pela qual nós optaríamos?
A velha questão é simples: e se todos gostássemos de amarelo? Sim, se todos gostássemos de amarelo o que seria do vermelho-vivo que representa o sangue, a vida, o que seria do azul celeste que nos remete ao céu, o que seria da sobriedade do preto ou da candura do branco? O que seria de nós, se não existissem pessoas que pensam diferente? O que seria da física sem o Einstein? Em que ponto estaríamos se, o então considerado louco Galileu, não tivesse descoberto que afinal é a Terra que gira à volta do Sol e não o contrário? Como saberíamos que o amor é fogo que arde sem se ver se não tivéssemos dado ouvidos a Camões?
Olhemo-nos ao espelho. Olhemos para fora de nós próprios como se fosse outro a olhar-nos. Encontremos todos os defeitos, todas as falhas, todas as imperfeições. Estendamos a mão em frente ao espelho e de volta teremos uma mão estendida para nós. Experimentemos recuar. Apenas iremos ganhar maior distância de nós próprios.
Se a imagem no espelho for o outro, então tudo o que damos será tudo o que recebemos. Gravemos a nossa voz para a ouvir depois. Poucos se reconhecem. Essa voz não é a minha. Sim, é a nossa. Mas ouvida de fora e não ouvida de dentro.
Este é o poder da percepção: depende sempre e em cada momento do ponto em que nos encontramos.
Gostei muito!
ResponderEliminarPermite-me apenas dizer que, em minha opinião, para que se encontre a "harmonia" entre os dois seres, o "eu" e o "outro", e deste modo podermos ser "singulares", verdadeiros e por isso também mais tranquilos e felizes, não restará apenas ter a consciência da pluralidade de entidades que reside em cada um de nós, ter a coragem de nos "enfrentarmos" junto ao espelho e exercitarmos a capacidade de harmonisar todos estes seres, mas acima de tudo termos a Vontade de o fazer. E para termos a vontade de o fazer, será necessário termos a capcidade de nos "despirmos" perante nós próprios e os outros. Julgo que a maioria, terá a consciência de que "é" para si, e que "aparenta ser" para os outros. A vulnerabilidade dos seres é tão grande, que se socorrem da máscara, que vão utilizando na proporção necessária a cada momento e em cada circunstância.
A questão é: é necessário que o "eu" se aceite em primeiro lugar, se ame verdadeiramente e só depois poderá ter a capacidade de se harmonisar com os "outros".
PLR
Pois que o meu eu nao bate muito certo com o meu outro. Dizem. Mas eu tenho grande capacidade de me por no outro, para perceber bem se o que o meu eu faz era uma coisa q o meu eu gostaria de receber. Dá para perceber? Se nao dá, tambem nao interessa muito, porque estamos naquele plano de debate que muita coisa nao se percebe, mas é bonito :)
ResponderEliminarTC