Não tinha ainda chegado ao final do lance de escadas que dava acesso à porta do prédio, quando começou a ouvir a D. Gertrudes a gritar do lado de fora:
- Sr. Professor, Sr. Professor! Venha depressa, sabe lá o que aconteceu!
Joaquim abriu a porta do prédio e por momentos teve dificuldade em encarar a luz. Os dias de Verão são pródigos em presentear-nos com uma luminosidade matinal que fere a vista dos que ainda mal passaram do sono à vigília.
- D. Gertrudes! Aconteceu alguma coisa?
- Oh Sr. Professor! Mas o senhor não ouve notícias de manhã? Venha comigo que lhe mostro o jornal!
Joaquim ainda tentou perguntar qualquer coisa, mas aquela mulher furacão, típica mulher do Norte, agarrou-o pelo braço e conduziu-o até à mercearia.
Na primeira página do jornal lia-se:”Director de Escola Primária detido por Tráfico de Armas”. A fotografia, impressa em tamanho grande sem contemplações, não deixava dúvidas, era o director da escola do Joaquim.
- Mas isto não pode ser D. Gertrudes! Eu conheço bem o Dr. José Luís Matoso. É um homem sério. Há aqui qualquer engano, tenho a certeza. Além disso eu tenho uma reunião marcada com ele para hoje, para agora! Uma reunião importante! Isto não pode ser… - Joaquim estava incrédulo. Podia pensar em muita gente que conhecia capaz de uma coisa daquelas, mas não o director da sua escola, pessoa que tinha aprendido a admirar e a respeitar.
- E agora o que é que eu faço D. Gertrudes? Vou sozinho ao Ministério? Eles querem lá saber de mim! Ainda pensam que também tenho alguma coisa a ver com isto!
- Dessas coisas dos Ministérios eu não percebo nada, mas só lhe digo Sr. Professor, é preciso muito cuidado com as companhias, isso é que é!
Perdido entre o espanto e a decepção, Joaquim saiu para fora da mercearia com um único pensamento: O que é que eu faço?
O Sol bateu-lhe em chapa nos olhos e não só lhe iluminou a vista, como lhe iluminou o espírito.
- Vou ao Ministério! Não tenho nada a perder.
Conseguiu chegar em cima da hora combinada, 8 e meia da manhã. Parecia haver ainda poucas pessoas no edifício. Dirigiu-se ao segurança, apresentou-se e disse ao que ia.
- Pode subir. O Sr. Dr. está à sua espera. Apanha aquele elevador e sai no 5º piso. É a 3ª porta à esquerda no corredor.
Com o coração a bater a um ritmo acelerado, aquela viagem de 5 andares mais parecia a subida ao cimo da Torre Eiffel. Seguiu as instruções do segurança e bateu à porta.
- Entre, entre – disse uma voz masculina vinda de dentro do gabinete.
Joaquim entrou.
- Estava à sua espera – o homem era alto e de porte imponente, mas ainda assim com um semblante simpático.
- Não tinha a certeza se deveria vir, dadas as circunstâncias… - Joaquim não sabia se deveria abordar o tema, mas não havia forma de o evitar.
- Fez muito bem em vir. Deixemo-nos de rodeios. A escola primária do Bairro das Fontes onde o senhor lecciona, precisa desde hoje de manhã de um director. O lugar é seu!
Joaquim ficou perplexo. Esta reunião revelava-se ainda melhor do que prometera.
Sem comentários:
Enviar um comentário