quarta-feira, 30 de junho de 2010

sem

Sem inspiração.

Sem paciência.

Sem ideias.

Sem vontade.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

as meias da tia

Quando oferecemos um presente a alguém, temos duas hipóteses: ou oferecemos algo que sabemos que a outra pessoa vai gostar, ou oferecemos algo que nós próprios gostaríamos de receber. 

Tendencialmente, numa manifestação de egoísmo que caracteriza o ser humano, acabamos por escolher o que nós gostaríamos que nos oferecessem. Escolhemos em função do nosso gosto, da nossa experiência, das nossas necessidades.

Assim são as empresas. Quantas empresas perdem tempo e dinheiro a oferecer-nos serviços ou produtos que nós não queremos, que nós não precisamos e que, em alguns casos, até pagaríamos para não ter.

Sendo geridas por pessoas, as empresas tendem a oferecer ao consumidor aquilo que pensam que ele quer, em vez de lhe perguntarem directamente “de que é que precisa?, o que é que o faria feliz?”.

Decidem o lançamento ou não de novos produtos/serviços e a forma de os comunicarem, com base em “estudos de mercado caseiros”, feitos junto daqueles com quem mantêm um relacionamento próximo que, por isso mesmo, terão opções e gostos muito semelhantes. É normalmente uma coisa muito técnica e científica, altamente representativa do público a que se destina, tipo: “olha lá, o que é que achas de lançar um vinho com sabor a cerveja?”, “que boa ideia pá!”. E pronto, está feito meio caminho para mais um flop que tinha tudo para dar certo.

Felizmente, são cada vez mais as empresas que têm um visão de marketing do seu negócio, e que percebem que existem para satisfazer o cliente. E para isso precisam de o conhecer, precisam despender tempo a perceber o que o consumidor procura e oferecer-lhe um produto/serviço à sua medida. Precisam de perceber e aceitar que o consumidor é cada vez mais informado e cada vez mais exigente.

Oferecer o produto/serviço certo ao cliente é a melhor (e única!) forma de atingir o objectivo do negócio: o lucro. Se o consumidor está interessado experimenta. E se experimenta e gosta compra outra vez. E se compra significa que a empresa vende e, – se as contas estiverem certas – tem lucro com a venda.

Se o marketing não tivesse evoluído e não fosse hoje uma realidade empresarial, continuaríamos todos a poder escolher a cor do nosso carro, desde que fosse preto (como dizia Henry Ford).

Se todos nós não tivéssemos aumentado o nosso grau de exigência, não só quando compramos, mas também quando oferecemos, continuaríamos todos a receber daquela Tia, uma meias (bem quentinhas) pelo Natal!

o pó dos dias

Sempre que acreditamos, os milagres acontecem.
E aquilo que falta a quem quer (e não pode)
é um "vai, que eu olho por ti".

de Eduardo Sá,
in Chega-te a mim e deixa-te estar

"A vida levanta pó que se farta. É o trabalho, os amigos, os amores insatisfeitos, a rotina que nos engole. São as crianças e o casamento, os pais e os irmãos, os sonhos (e as acrobacias com que os iludimos), e mais até. Fica no ar, cola-se a nós, respiramo-lo com parcimónia, e entranha-se (bem fundo) como uma sereia que encanta e nos adormece de sossego.

O pó dos dias não nos irrita as mucosas: inflama o nosso olhar e aloja-se, como um vírus que aí encontra um hospedeiro, no modo como deixamos de escutar com o coração e nos contentamos em ouvir. Resignadamente, em ouvir. Mesmo que, para fugirmos dele, como uma melga que se insinua nos ouvidos, levantamos mais pó, e mais pó, evitando que ele assente, devagar, e nos puxe - enfim - para pensar.

O pó dos dias leva a que imaginemos que a vida corre por si. Sem que precise de um mestre de costa ou de um homem ao leme. Conduz-nos para veredas íngremes e para couraças escorregadias. Faz das pessoas vultos, e parece tornar opaco o nosso querer. Ah!, e obriga-nos a lamentar, quase para sempre, o quanto desejávamos transformar o pó dos dias numa manhã de sol. Se pudéssemos... é claro.

Nem sempre querer é poder. Muitas vezes, quer-se e não se pode. A diferença está entre querer... e acreditar que se pode.

Sempre que acreditamos, os milagres acontecem. E aquilo que falta a quem quer (e não pode) é um "vai, que eu olho por ti". Alguém que, algures na nossa vida, nos tenha dado a suprema bondade de acreditar naquilo em que acreditamos, e de querer o que nós queremos, que transforma o querer em poder.

Em verdade, o truque esconde-se neste pequeno pormenor: quando se quer, ninguém consegue ir - mesmo que vá pelos seus sonhos - contra todos os que, afirmando que gostam de nós, jamais nos dizem:"vai, que eu serei a tua âncora". Ou "vai que eu olho por ti". (Por vezes dizem mesmo, embrulhado num silêncio cobarde: "se fores, deixo de olhar para ti").

Todos nós precisamos de uma âncora para que os milagres aconteçam e, assim, se vença o pó dos dias. E talvez seja isso o que a vida tem de mais desconcertante: não são os ventos nem as marés, só as âncoras... nos permitem navegar."

quarta-feira, 16 de junho de 2010

o que ninguém sabe

O que ninguém sabe

é o tempo,

às vezes ardente de laranja fogo,

outras de um cinza escuro que (quase) mata.

 

O que ninguém sabe

é o vento,

a brisa que refresca num fim de tarde

ou a força que nos tira os pés do chão.

 

 

O que ninguém sabe

sou eu,

e as linhas que trago na cara

as marcas cravadas no corpo

que são o mapa da minha vida.

 

O que ninguém sabe

somos nós,

aquilo que nos vai cá dentro,

as histórias que fomos vivendo

e que nos fazem aquilo que somos.

terça-feira, 15 de junho de 2010

ele há coisas

E eu, que disse não perceber as Mães e os Pais que ficam à porta da escola a dizer adeus ao autocarro que leva os filhos para os passeios e a tirar fotografias para mais tarde recordar, fui hoje – ao 2º dia de ida para a praia com a escola - confrontada com a seguinte frase da minha filha:

- Não te vais embora! Ficas à porta da escola a tirar fotografias!

- …

E eu fiquei sem palavras…

E fiquei a pensar no circo que deve ter sido ontem a saída dos autocarros…

E fiquei a pensar que as crianças dão importância a coisas que eu não imaginava….

E fiquei a pensar que tinha a máquina na mala mas que definitivamente não ia ficar a tirar fotografias…

E fui trabalhar.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

sometimes

terça-feira, 8 de junho de 2010

livro de vida 2 - as papas, as férias, o 1º aniversário


A Primeira Papa

Estes Pais são um bocadinho estranhos. Agora sentaram-me numa cadeira a que chamam “cadeira de comer”. Mas que raio é uma cadeira de comer? Melhor, o que é “comer”? Pelo que percebo, tem a ver com aquilo que eles fazem à mesa, que é enfiar para a boca umas coisas esquisitas que depois engolem. A mim não me deixam eles pôr coisas na boca!
Nestes 4 meses de vida, só me deixaram engolir o leite que bebo do biberão. E é bem bom!


Estamos na cozinha. A minha Mãe lá pega numa caixa - que tem a fotografia de um bébé - e em água e põe-se a misturar aquilo tudo. Entretanto chega o meu Pai. Pela conversa percebo que veio a casa de propósito por causa daquilo. Chamam-lhe papa. Eu por mim chamem-lhe o que quiserem que eu tenho é fome e já bebia o meu leite!
A minha Mãe senta-se em frente a mim e põe-me na boca uma coisa chamada colher. Nessa tal de colher vem a tal da papa. Huuuummmm..... é bom! Parece leite mas sabe melhor. Bom, acho que também parece leite porque eles conversam e a minha Mãe diz que está muito líquida. Não é ser má língua, mas quer parecer-me que a minha Mãe não tem muito jeito para fazer a papa...

O meu Pai tira fotografias. Mas porquê? Quando eles estão os dois à mesa a comer não tiram fotografias um ao outro!!!! Os adultos são muito estranhos, é o que eu posso dizer.


E agora que já sei o que é comer, acho que vou gostar desta coisa das papas!




As Primeiras Férias

Ainda agora comecei nesta coisa das papas e já lá vem mais uma invenção. Diz que vamos de férias. Sempre estou para ver o que é isso das férias. A avaliar pela excitação dos meus Pais deve ser uma coisa boa.


A minha Mãe põe dentro de uma mala as minhas roupas. Todas. Será que vamos mudar de casa? Eu não queria, gosto tanto desta!


O meu Pai pega nas malas todas e leva-as para o carro. Parece que está tudo (e que não cabe mais nada!).

Põe-me na cadeira e lá vamos nós. Mas isto é que são as férias? De carro já eu estou farta de andar, não estou a ver a novidade. O melhor é dormir um bocadinho que já ouvi dizer que hoje o passeio é maior do que o costume.


Acordo. Olho à volta e estou num sítio que nunca vi. E também não conheço o cheiro que é diferente. É melhor. E aqui há Sol. E silêncio. Não sei onde fica, mas parece que chegámos às férias. Ou ao Alentejo. Só ainda não percebi porque é que agora tem outro nome.


Entramos numa casa diferente. O meu Pai vai buscar ao carro todas as malas que trouxemos. A minha Mãe põe-me numa manta no chão com os meus brinquedos e começa a tirar das malas tudo o que está lá dentro e arruma nas gavetas e nos armários desta casa. Que trabalheira! Ainda agora tinha tirado tudo dos armários e gavetas lá de casa!

Depois de tudo arrumado é altura de ir passear e começo a perceber esta coisa das férias. Vamos para uma banheira gigante a que chamam piscina e onde podemos nadar e chapinhar à vontade. De manhã cedo vamos até um sítio que se chama praia e que eu adoro: tem muita água onde também podemos tomar banho e ficamos sentados a brincar na areia à sombra do chapéu. Os meus pais estão tão felizes. E eu também!

A minha Mãe farta-se de rir. O meu Pai carrega com tudo do carro até á praia: chapéu, toalhas, sacos com as minhas coisas. E eu vou ao colo da minha Mãe a admirar a paisagem. Boa vida, a minha e a da minha Mãe!


Depois da praia e da piscina lá vamos para casa. Estes dois devem ter a mania da água. Então não chegam os banhos que já tomámos, é preciso tomar banho outra vez quando chegamos a casa?!


Depois, uma papa das boas (quer dizer, agora já tenho que comer sopa mas não me importo que estes ares do Alentejo abrem-me o apetite) e uma longa sesta.


Gosto desta coisa das férias! Podemos repetir mais vezes!




O Primeiro Aniversário



Hoje faço um ano. E aprendi tantas coisas este ano! Tantas, tantas, que quase consigo andar sozinha sem a ajuda de ninguém. Já sei dizer algumas palavras e mesmo quando não digo faço-me entender muito bem.


Como hoje é o dia do meu aniversário, os meus Pais não foram trabalhar e fomos passar o dia os 3. Fomos ao oceanário, um sítio onde há muitos , muitos peixes. Gostei muito, principalmente das lontras: a Amália e o Eusébio, são mesmo divertidos. A festa lá em casa é amanhã.

Os meus pais convidaram toda a gente: os meus Avós, as minhas Tias, os meus primos e os nossos amigos todos para virem festejar o meu primeiro aniversário. Há balões e faixas de parabéns pela casa. Tenho um bolo muito lindo com desenhos de flores e uma vela com um número 1.Todos me trouxeram presentes muito bonitos. Se for sempre assim tão bom, quero fazer anos mais vezes!


só o que podemos dar

"(...)
- Se eu ordenasse a um general que voasse de flor em flor como as borboletas, ou que escrevesse uma tragédia, ou que se transformasse em gaivota e se o general não executasse a ordem recebida, de quem era a culpa: minha ou dele?

- Era Vossa - respondeu firmemente o Principezinho.

- Pois era. Só se pode exigir a uma pessoa o que essa pessoa pode dar - prosseguiu o rei. - A autoridade baseia-se, antes de mais, no bom senso. (...) "

in O Principezinho,
 Antoine de Saint-Exupéry

quarta-feira, 2 de junho de 2010

os amigos

Quando somos crianças, fazer amigos parece ser o mais fácil de tudo.

Não interessa o nome, o sexo, a nacionalidade, nem importa se falamos a mesma língua. Duas crianças começam a brincar e pronto. Está feita a amizade. E a amizade pode durar de um minuto  a uma hora. Não interessa. Somos amigos o tempo que durar a relação. E isso chega.

Depois passamos a adolescentes.

E os amigos passam a ser o centro do mundo. São mais importantes que os pais, que os irmãos, que toda a família junta. Os amigos são deuses que nos guiam e amparam. São o centro das nossas atenções. São aquelas pessoas com quem queremos sempre estar e com quem estamos todos os minutos possíveis. É a fase dos "melhores amigos". é a fase das primeiras grandes desilusões, quando percebemos que os nossos grandes amigos não são seres perfeitos. E muitas vezes magoam-nos, atraiçoam-nos, "trocam-nos" por outros amigos. Na adolescência, temos dezenas de amigos. As nossas festas de anos parecem jantares de turma. Somos 30. Somos 40. Somos um mundo de amigos e a nossa popularidade mede-se pelo número de presenças na nossa a festa de aniversário.

E viramos adultos.

E o número de amigos diminui consideravelmene. Passamos a ser mais selectivos. Chamamos amigos a um grupo restrito de pessoas que nos acompanham nos momentos verdadeiramente importantes. Já não nos encontramos todas as Sextas e Sábados à noite. Encontramo-nos às vezes, em casa de uns e de outros, quando o resto da vida nos permite. Já não nos encontramos em todas as festas, em todos os concertos, às vezes nem sequer em todos os aniversários. Mas sabemos que nos encontramos em todas as separações, em todos os acidentes, em todas as doenças, em todos os velórios, em todos os funerais. Infelizmente, nesta altura da vida, encontramo-nos cada vez mais em alturas de tristeza e menos em alturas de alegria. Somos cada vez menos. Mas valemos cada vez mais.

Os amigos são as pessoas que escolhemos para partilhar a nossa vida. Sem imposições de sangue. São aquelas pessoas que sabemos que "estão lá", para o que for preciso. Os amigos são os irmãos que os nossos Pais não tiveram. Com quem partilhamos tudo o que é. E não tudo o que foi.

Há amigos de quem gostamos tanto, tanto, que nos dói a alma quando lhes dói a alma.

Há amigos de quem gostamos tanto, tanto, que ficamos felizes como crianças quando eles estão felizes.

Não gosto de anos pares. Os anos pares fazem-me mal a mim e aos meus amigos.