Há muito que o voluntariado era um bichinho que me rondava os pensamentos. Mas sempre que pensava nisso, só conseguia pensar em voluntariado que obriga a lidar com o sofrimento dos outros. Hospitais, instituições de solidariedade social onde há histórias de uma tristeza sem fim. Não sei se se chama egoísmo ou excesso de sensibilidade, a verdade é que eu não tenho estofo para lidar com o sofrimento dos outros.
Às vezes, pensava em colaborar com o Banco Alimentar. É uma ajuda preciosa, que não implica o contacto directo com as pessoas que precisam de nós. Por razões profissionais contactei de perto com a Entrajuda e passei a admirar ainda mais o trabalho que ali fazem. "Um dia, inscrevo-me para ajudar numa campanha de angariação de alimentos", pensei eu muitas vezes. Mas esse dia nunca chegou. Preguiça. Inércia. Talvez. Mas nunca me deu aquele click que precisamos para nos mexermos da cadeira.
Até à semana passada, em que recebi um email na caixa de correio. A biblioteca da nova escola da Daniela precisa de voluntários. Têm um espaço excelente, mas apenas uma professora afecta ao projecto. E eu pensei: é isto mesmo! O que melhor podia ser do que um sítio onde imperam os livros e as histórias? Apenas duas horas por semana que podem fazer a diferença.
Não podemos mudar o mundo. Mas podemos ajudar a melhorar os pequenos círculos onde nos movimentamos todos os dias. E promover a paixão pelos livros, é incentivar ao conhecimento e à riqueza interior. "A pobreza combate-se com a educação", defende Isabel Jonet.
Começo amanhã.
segunda-feira, 30 de setembro de 2013
segunda-feira, 23 de setembro de 2013
Há quem tenha medo de andar de avião. Eu tenho medo de andar de táxi.
Sim, eu sei. É esquisito.
Há pessoas que morrem de medo de andar de avião. Que fazem testamento e mil recomendações à família antes de se aventurarem numa viagem pelos céus. Que não dormem nos 5 dias que antecedem a partida, e mal respiram assim que entram no pássaro voador.
Eu não. Sigo consciente de que aquilo pode cair. Mas isso não me afecta em demasia. Não tenho medo de morrer. Tenho pena. E como a probabilidade de nos safarmos de um acidente de avião é tão remota, nem me dou ao trabalho de pensar nisso. Porque o que me preocupa nos acidentes não é a morte. São as mazelas que daí podem ficar. Isso sim, é assustador.
O que me leva à ideia inicial: o Táxi. Não é que tenha medo, propriamente. É que não gosto. A perspectiva de entrar num carro com um tipo que eu não conheço e que tem o controlo total do meu destino é coisa que me incomoda.
Começa logo pelo facto de eu não gostar de andar de carro com outras pessoas a conduzir. E, verdade seja dita, os taxistas (regra geral) são uma pequenas bestas a conduzir. Não respeitam as regras, não respeitam os outros condutores, não respeitam os peões e não respeitam que lá vai dentro. Começamos por isso mal.
E depois é a incerteza. Quem me diz a mim, que aquela pessoa não é um psicopata furioso à espera de agarrar a sua próxima vítima? Quem me diz a mim que não me vai levar para um barracão e tirar-me um rim (ou até outra coisa que me faça mais falta, que rins até tenho dois)? Ou que não me vai cortar às postas e enfiar numa mala que depois atira ao Tejo e nunca mais ninguém sabe de mim? (O que seria muito aborrecido porque sem corpo as companhias de seguros não pagam os seguros de vida e depois de tantos anos a investir nisso dava jeito a quem fica receber qualquer coisa. Mas adiante.)
Por tudo isto, prefiro sempre levar o carro, seja para onde for. Até porque o problema de antes já não se põe. O estacionamento. Lisboa tem hoje sempre um parque de estacionamento à mão. E eu sou fã de parques de estacionamento. Principalmente dos que têm Via Verde. Isso sim é qualidade de vida!
Acresce a isso que, mesmo nas saídas à noite, não me excedo nos copos, pelo que também nunca chega a ser uma condicionante.
Ora, numa dessas parcas vezes em que ando de táxi, ainda para mais sozinha e já de madrugada, ocorreu-me que podia fazer uso das horas que passo a ver séries de investigação na TV. Então, eu tenho um smartphone, certo? E o smartphone tem GPS. E hoje há dezenas daquelas aplicações "encontre os seus amigos", que são muito irritantes, mas no caso podem dar jeito. E eu pensei "bem, vou ligar a coisa. Com sorte a lâmina que me vai cortar às postas não acerta no bicho e ele segue comigo para o fundo do rio. Ainda me encontram e o pessoal sempre recebe o dinheiro a que tem direito!"
E assim fiz.
Felizmente não foi preciso. O senhor deixou-me direitinha à porta de casa. E nem falou comigo! Que, já agora, também é coisa que eu prefiro que não aconteça.
Há pessoas que morrem de medo de andar de avião. Que fazem testamento e mil recomendações à família antes de se aventurarem numa viagem pelos céus. Que não dormem nos 5 dias que antecedem a partida, e mal respiram assim que entram no pássaro voador.
Eu não. Sigo consciente de que aquilo pode cair. Mas isso não me afecta em demasia. Não tenho medo de morrer. Tenho pena. E como a probabilidade de nos safarmos de um acidente de avião é tão remota, nem me dou ao trabalho de pensar nisso. Porque o que me preocupa nos acidentes não é a morte. São as mazelas que daí podem ficar. Isso sim, é assustador.
O que me leva à ideia inicial: o Táxi. Não é que tenha medo, propriamente. É que não gosto. A perspectiva de entrar num carro com um tipo que eu não conheço e que tem o controlo total do meu destino é coisa que me incomoda.
Começa logo pelo facto de eu não gostar de andar de carro com outras pessoas a conduzir. E, verdade seja dita, os taxistas (regra geral) são uma pequenas bestas a conduzir. Não respeitam as regras, não respeitam os outros condutores, não respeitam os peões e não respeitam que lá vai dentro. Começamos por isso mal.
E depois é a incerteza. Quem me diz a mim, que aquela pessoa não é um psicopata furioso à espera de agarrar a sua próxima vítima? Quem me diz a mim que não me vai levar para um barracão e tirar-me um rim (ou até outra coisa que me faça mais falta, que rins até tenho dois)? Ou que não me vai cortar às postas e enfiar numa mala que depois atira ao Tejo e nunca mais ninguém sabe de mim? (O que seria muito aborrecido porque sem corpo as companhias de seguros não pagam os seguros de vida e depois de tantos anos a investir nisso dava jeito a quem fica receber qualquer coisa. Mas adiante.)
Por tudo isto, prefiro sempre levar o carro, seja para onde for. Até porque o problema de antes já não se põe. O estacionamento. Lisboa tem hoje sempre um parque de estacionamento à mão. E eu sou fã de parques de estacionamento. Principalmente dos que têm Via Verde. Isso sim é qualidade de vida!
Acresce a isso que, mesmo nas saídas à noite, não me excedo nos copos, pelo que também nunca chega a ser uma condicionante.
Ora, numa dessas parcas vezes em que ando de táxi, ainda para mais sozinha e já de madrugada, ocorreu-me que podia fazer uso das horas que passo a ver séries de investigação na TV. Então, eu tenho um smartphone, certo? E o smartphone tem GPS. E hoje há dezenas daquelas aplicações "encontre os seus amigos", que são muito irritantes, mas no caso podem dar jeito. E eu pensei "bem, vou ligar a coisa. Com sorte a lâmina que me vai cortar às postas não acerta no bicho e ele segue comigo para o fundo do rio. Ainda me encontram e o pessoal sempre recebe o dinheiro a que tem direito!"
E assim fiz.
Felizmente não foi preciso. O senhor deixou-me direitinha à porta de casa. E nem falou comigo! Que, já agora, também é coisa que eu prefiro que não aconteça.
sábado, 21 de setembro de 2013
Back to School#1
E pronto, lá ficou.
Ser mãe (ou pai), é isto mesmo. Quando decidimos que ía mudar de escola, fizemo-lo de modo consciente. Na altura não teve nada que ver com dinheiro, menos ainda com o facto de podermos achar que a escola em que andava não servia o objectivo de aprender mais e melhor. Teve apenas que ver com o facto de acreditarmos que a escola não deve ensinar apenas os números e as letras. Deve preparar para a vida. Que é preciso que percebam que a realidade do mundo não é a redoma de vidro em que estava confortavelmente (ela e nós) na escola anterior.
Preparar para a vida é perceber as diferenças. Conviver com elas. É ter que ganhar as suas defesas, encontrar os seus pontos de equilíbrio. É conviver com meninos de outras culturas, de outros meios sociais e económicos. E estar presente para explicar o que é mais difícil de perceber, formar para a aceitação do outro. É deixá-los perceber que o coração sangra muitas vezes, mas que estaremos lá para curar as feridas, com amor, com carinho, com compreensão.
Hoje deixei-a nesse novo mundo. Num mundo de portão aberto. De muitas crianças e grande confusão. Com pessoas que não conheço, que não sei se têm a capacidade e a inteligência emocional necessárias para perceber que todas as crianças são diferentes. Ficou. Descansou mais quando a sua amiga chegou e nela encontrou um porto seguro.
E eu vim-me embora. Chorei. Confesso que chorei. Mais do que no primeiro dia em que a deixei com a ama quando tinha 6 meses. Mais do que no dia em que a deixei com dois anos e meio na escola. Da primeira vez, chorei porque ela não podia perceber porque é que eu a deixava com uma pessoa que ela não conhecia. Porque a deixava pela primeira vez desde que tinha começado a crescer dentro de mim. Mas deixei-a com a certeza de que dificilmente ficaria melhor entregue. Da segunda vez, chorei porque tive de a deixar num ambiente novo, mais uma vez sem que ela percebesse porquê, mas com confiança em quem ficava com ela. Com a certeza de que teria toda a atenção do mundo.
Hoje chorei porque a deixei num mundo muito diferente do que ela conhece. Com pessoas que ela não conhece e que eu não conheço. Porque sei (desconfio, vá) que ali não terá a mesma atenção e o mesmo carinho a que está habituada. Porque haverá decerto miúdos e miúdas estúpidos que a farão sofrer. Porque não tenho a certeza se as pessoas que lá estão têm a capacidade, ou mesmo o interesse, de a acompanhar como eu gostaria.
Provavelmente, doeu-me mais a mim do que lhe doeu a ela. Que ficou com a certeza de ter à sua espera um mundo novo, de aprendizagem e conhecimento.
Sou assim, eu. Firme e hirta quando a situação o exige. Mas desmorono mais depressa que um castelo de cartas no segundo em que a minha força já não é necessária. Tive vontade de pegar nela e ir a correr para a escola antiga. Pedir desculpa por chegar assim, sem avisar, dias depois de já terem começado o trabalho.
Mas não podemos, pois não? Não podemos andar com eles ao colo a vida inteira. Não podemos evitar os sofrimentos e os perigos que, se tudo correr bem, servirão apenas para os fazer crescer mais fortes e mais conscientes.
Não me contive, e chorei ao telefone com o meu marido, que estará também ansioso, mas que tem de trabalhar e não precisava de uma maria-maluca a destabilizar-lhe a cabeça. E chorei depois com o meu próprio Pai, que me perguntou "queres que vá aí?". E ser pai e mãe é isto mesmo. É não poder evitar o sofrimento, mas minimizá-lo um bocadinho com a presença. Mesmo quando temos quase 40 anos.
Hoje começa uma nova etapa para todos nós. E eu sei que será uma etapa maravilhosa, de crescimento, de conhecimento, de novos amigos.
Agora já passou, não vou chorar mais (se bem que ainda não falei com a minha mãe, o que eleva em muito o risco das lágrimas me voltarem a torvar os olhos...).
É o coração. É o coração de Mãe que nos deixa assim, parvas.
Ser mãe (ou pai), é isto mesmo. Quando decidimos que ía mudar de escola, fizemo-lo de modo consciente. Na altura não teve nada que ver com dinheiro, menos ainda com o facto de podermos achar que a escola em que andava não servia o objectivo de aprender mais e melhor. Teve apenas que ver com o facto de acreditarmos que a escola não deve ensinar apenas os números e as letras. Deve preparar para a vida. Que é preciso que percebam que a realidade do mundo não é a redoma de vidro em que estava confortavelmente (ela e nós) na escola anterior.
Preparar para a vida é perceber as diferenças. Conviver com elas. É ter que ganhar as suas defesas, encontrar os seus pontos de equilíbrio. É conviver com meninos de outras culturas, de outros meios sociais e económicos. E estar presente para explicar o que é mais difícil de perceber, formar para a aceitação do outro. É deixá-los perceber que o coração sangra muitas vezes, mas que estaremos lá para curar as feridas, com amor, com carinho, com compreensão.
Hoje deixei-a nesse novo mundo. Num mundo de portão aberto. De muitas crianças e grande confusão. Com pessoas que não conheço, que não sei se têm a capacidade e a inteligência emocional necessárias para perceber que todas as crianças são diferentes. Ficou. Descansou mais quando a sua amiga chegou e nela encontrou um porto seguro.
E eu vim-me embora. Chorei. Confesso que chorei. Mais do que no primeiro dia em que a deixei com a ama quando tinha 6 meses. Mais do que no dia em que a deixei com dois anos e meio na escola. Da primeira vez, chorei porque ela não podia perceber porque é que eu a deixava com uma pessoa que ela não conhecia. Porque a deixava pela primeira vez desde que tinha começado a crescer dentro de mim. Mas deixei-a com a certeza de que dificilmente ficaria melhor entregue. Da segunda vez, chorei porque tive de a deixar num ambiente novo, mais uma vez sem que ela percebesse porquê, mas com confiança em quem ficava com ela. Com a certeza de que teria toda a atenção do mundo.
Hoje chorei porque a deixei num mundo muito diferente do que ela conhece. Com pessoas que ela não conhece e que eu não conheço. Porque sei (desconfio, vá) que ali não terá a mesma atenção e o mesmo carinho a que está habituada. Porque haverá decerto miúdos e miúdas estúpidos que a farão sofrer. Porque não tenho a certeza se as pessoas que lá estão têm a capacidade, ou mesmo o interesse, de a acompanhar como eu gostaria.
Provavelmente, doeu-me mais a mim do que lhe doeu a ela. Que ficou com a certeza de ter à sua espera um mundo novo, de aprendizagem e conhecimento.
Sou assim, eu. Firme e hirta quando a situação o exige. Mas desmorono mais depressa que um castelo de cartas no segundo em que a minha força já não é necessária. Tive vontade de pegar nela e ir a correr para a escola antiga. Pedir desculpa por chegar assim, sem avisar, dias depois de já terem começado o trabalho.
Mas não podemos, pois não? Não podemos andar com eles ao colo a vida inteira. Não podemos evitar os sofrimentos e os perigos que, se tudo correr bem, servirão apenas para os fazer crescer mais fortes e mais conscientes.
Não me contive, e chorei ao telefone com o meu marido, que estará também ansioso, mas que tem de trabalhar e não precisava de uma maria-maluca a destabilizar-lhe a cabeça. E chorei depois com o meu próprio Pai, que me perguntou "queres que vá aí?". E ser pai e mãe é isto mesmo. É não poder evitar o sofrimento, mas minimizá-lo um bocadinho com a presença. Mesmo quando temos quase 40 anos.
Hoje começa uma nova etapa para todos nós. E eu sei que será uma etapa maravilhosa, de crescimento, de conhecimento, de novos amigos.
Agora já passou, não vou chorar mais (se bem que ainda não falei com a minha mãe, o que eleva em muito o risco das lágrimas me voltarem a torvar os olhos...).
É o coração. É o coração de Mãe que nos deixa assim, parvas.
sexta-feira, 20 de setembro de 2013
Back to School: mas agora do outro lado#1
Lembro-me da expectativa de conhecer professores novos, e pergunto-me o que terão pensado de mim quando entraram na sala. Agradeço o facto de a telepatia não fazer parte dos dons que possa ter, mantendo-me na confortável ignorância de quem ainda tem ilusões.
Diz que houve festa no dia anterior à noite. O que fez com que tivesse apenas a presença de duas alunas na aula da manhã. Até que não foi mau assim. Sempre deu para me ir ambientando e adaptando a este meu novo papel e a este novo nome que teimam em me chamar e ao qual eu ainda não respondo por instinto: professora.
É óbvio que ambas eram alunas interessadas e interessantes, o que facilitou e muito o diálogo. Apesar disso, não se conseguiram evitar uns bocejos de uma, e umas trocas de SMS de outra, ainda que de forma muito bem dissimulada.
A tarde trouxe-me 6 alunos. Sendo que apareceram quase 20 minutos depois, já eu estava quase a desistir. Ao que parece estavam lá em baixo à porta, à espera que "a professora" entrasse no edifício. E eu já estava na sala à espera que eles chegassem. 10 minutos antes da hora. Aprendi que os anfitriões esperam pelos convidados e é como anfitriã que me sinto.
Separam-nos praticamente 20 anos de vida, mas percebi que sentem exactamente o mesmo que eu sentia quando andava na faculdade. Podem ter telemóveis, internet e 300 canais de televisão. Na essência, no que ao futuro diz respeito, têm as mesmas incertezas, as mesmas dúvidas.
Acredito que um professor é alguém que pode fazer a diferença na nossa vida. Para o bem e para o mal. Que, se tiver a humildade e a sensatez necessárias, pode encaminhar os alunos para uma ou outra escolha. Ainda que o faça, na maioria das vezes, sem intenção.
Saí feliz. Feliz pela minha prestação. Feliz por sentir que irei ganhar muitas coisas. Feliz por perceber que, afinal, o que sei pode ser importante. Irei aprender muito. Irei ter a oportunidade de conhecer pessoas de uma faixa etária com a qual convivo pouco.
Do que eu tenho para aprender com eles e do que tenho para lhes ensinar, se fará um novo mundo. Com novas experiências, novas partilhas, novos sentimentos. Um mundo que será meu.
Diz que houve festa no dia anterior à noite. O que fez com que tivesse apenas a presença de duas alunas na aula da manhã. Até que não foi mau assim. Sempre deu para me ir ambientando e adaptando a este meu novo papel e a este novo nome que teimam em me chamar e ao qual eu ainda não respondo por instinto: professora.
É óbvio que ambas eram alunas interessadas e interessantes, o que facilitou e muito o diálogo. Apesar disso, não se conseguiram evitar uns bocejos de uma, e umas trocas de SMS de outra, ainda que de forma muito bem dissimulada.
A tarde trouxe-me 6 alunos. Sendo que apareceram quase 20 minutos depois, já eu estava quase a desistir. Ao que parece estavam lá em baixo à porta, à espera que "a professora" entrasse no edifício. E eu já estava na sala à espera que eles chegassem. 10 minutos antes da hora. Aprendi que os anfitriões esperam pelos convidados e é como anfitriã que me sinto.
Separam-nos praticamente 20 anos de vida, mas percebi que sentem exactamente o mesmo que eu sentia quando andava na faculdade. Podem ter telemóveis, internet e 300 canais de televisão. Na essência, no que ao futuro diz respeito, têm as mesmas incertezas, as mesmas dúvidas.
Acredito que um professor é alguém que pode fazer a diferença na nossa vida. Para o bem e para o mal. Que, se tiver a humildade e a sensatez necessárias, pode encaminhar os alunos para uma ou outra escolha. Ainda que o faça, na maioria das vezes, sem intenção.
Saí feliz. Feliz pela minha prestação. Feliz por sentir que irei ganhar muitas coisas. Feliz por perceber que, afinal, o que sei pode ser importante. Irei aprender muito. Irei ter a oportunidade de conhecer pessoas de uma faixa etária com a qual convivo pouco.
Do que eu tenho para aprender com eles e do que tenho para lhes ensinar, se fará um novo mundo. Com novas experiências, novas partilhas, novos sentimentos. Um mundo que será meu.
quinta-feira, 12 de setembro de 2013
O Poder da Ubiquidade visto por uma Criança de 6 Anos
- Mãe, eu já estive em dois sítios ao mesmo tempo.
- Então?!
- Quando era um espermatozoide ía para todos os sítios que o pai ía, e era um óvulo e ía para todos os sítios que tu ías!
- pois (.....)
segunda-feira, 9 de setembro de 2013
Coração de Mãe
E pronto, lá ficou.
Ser mãe (ou pai), é isto mesmo.
Quando decidimos que ía mudar de escola, fizemo-lo de modo consciente. Na altura não teve nada que ver com dinheiro, menos ainda com o facto de podermos achar que a escola em que andava não servia o objectivo de aprender mais e melhor. Teve apenas que ver com o facto de acreditarmos que a escola não deve ensinar apenas os números e as letras. Deve preparar para a vida. Que é preciso que percebam que a realidade do mundo não é a redoma de vidro em que estava confortavelmente (ela e nós) na escola anterior.
Preparar para a vida é perceber as diferenças. Conviver com elas. É ter que ganhar as suas defesas, encontrar os seus pontos de equilíbrio. É conviver com meninos de outras culturas, de outros meios sociais e económicos. E estar presente para explicar o que é mais difícil de perceber, formar para a aceitação do outro. É deixá-los perceber que o coração sangra muitas vezes, mas que estaremos lá para curar as feridas, com amor, com carinho, com compreensão.
Hoje deixei-a nesse novo mundo. Num mundo de portão aberto. De muitas crianças e grande confusão. Com pessoas que não conheço, que não sei se têm a capacidade e a inteligência emocional necessárias para perceber que todas as crianças são diferentes. Ficou. Descansou mais quando a sua amiga chegou e nela encontrou um porto seguro.
E eu vim-me embora. Chorei. Confesso que chorei. Mais do que no primeiro dia em que a deixei com a ama quando tinha 6 meses. Mais do que no dia em que a deixei com dois anos e meio na escola. Da primeira vez, chorei porque ela não podia perceber porque é que eu a deixava com uma pessoa que ela não conhecia. Porque a deixava pela primeira vez desde que tinha começado a crescer dentro de mim. Mas deixei-a com a certeza de que dificilmente ficaria melhor entregue. Da segunda vez, chorei porque tive de a deixar num ambiente novo, mais uma vez sem que ela percebesse porquê, mas com confiança em quem ficava com ela. Com a certeza de que teria toda a atenção do mundo.
Hoje chorei porque a deixei num mundo muito diferente do que ela conhece. Com pessoas que ela não conhece e que eu não conheço. Porque sei (desconfio, vá) que ali não terá a mesma atenção e o mesmo carinho a que está habituada. Porque haverá decerto miúdos e miúdas estúpidos que a farão sofrer. Porque não tenho a certeza se as pessoas que lá estão têm a capacidade, ou mesmo o interesse, de a acompanhar como eu gostaria.
Provavelmente, doeu-me mais a mim do que lhe doeu a ela. Que ficou com a certeza de ter à sua espera um mundo novo, de aprendizagem e conhecimento.
Sou assim, eu. Firme e hirta quando a situação o exige. Mas desmorono mais depressa que um castelo de cartas no segundo em que a minha força já não é necessária. Tive vontade de pegar nela e ir a correr para a escola antiga. Pedir desculpa por chegar assim, sem avisar, dias depois de já terem começado o trabalho.
Mas não podemos, pois não? Não podemos andar com eles ao colo a vida inteira. Não podemos evitar os sofrimentos e os perigos que, se tudo correr bem, servirão apenas para os fazer crescer mais fortes e mais conscientes.
Não me contive, e chorei ao telefone com o meu marido, que estará também ansioso, mas que tem de trabalhar e não precisava de uma maria-maluca a destabilizar-lhe a cabeça. E chorei depois com o meu próprio Pai, que me perguntou "queres que vá aí?". E ser pai e mãe é isto mesmo. É não poder evitar o sofrimento, mas minimizá-lo um bocadinho com a presença. Mesmo quando temos quase 40 anos.
Hoje começa uma nova etapa para todos nós. E eu sei que será uma etapa maravilhosa, de crescimento, de conhecimento, de novos amigos.
Agora já passou, não vou chorar mais (se bem que ainda não falei com a minha mãe, o que eleva em muito o risco das lágrimas me voltarem a torvar os olhos...).
É o coração. É o coração de Mãe que nos deixa assim, parvas.
Ser mãe (ou pai), é isto mesmo.
Quando decidimos que ía mudar de escola, fizemo-lo de modo consciente. Na altura não teve nada que ver com dinheiro, menos ainda com o facto de podermos achar que a escola em que andava não servia o objectivo de aprender mais e melhor. Teve apenas que ver com o facto de acreditarmos que a escola não deve ensinar apenas os números e as letras. Deve preparar para a vida. Que é preciso que percebam que a realidade do mundo não é a redoma de vidro em que estava confortavelmente (ela e nós) na escola anterior.
Preparar para a vida é perceber as diferenças. Conviver com elas. É ter que ganhar as suas defesas, encontrar os seus pontos de equilíbrio. É conviver com meninos de outras culturas, de outros meios sociais e económicos. E estar presente para explicar o que é mais difícil de perceber, formar para a aceitação do outro. É deixá-los perceber que o coração sangra muitas vezes, mas que estaremos lá para curar as feridas, com amor, com carinho, com compreensão.
Hoje deixei-a nesse novo mundo. Num mundo de portão aberto. De muitas crianças e grande confusão. Com pessoas que não conheço, que não sei se têm a capacidade e a inteligência emocional necessárias para perceber que todas as crianças são diferentes. Ficou. Descansou mais quando a sua amiga chegou e nela encontrou um porto seguro.
E eu vim-me embora. Chorei. Confesso que chorei. Mais do que no primeiro dia em que a deixei com a ama quando tinha 6 meses. Mais do que no dia em que a deixei com dois anos e meio na escola. Da primeira vez, chorei porque ela não podia perceber porque é que eu a deixava com uma pessoa que ela não conhecia. Porque a deixava pela primeira vez desde que tinha começado a crescer dentro de mim. Mas deixei-a com a certeza de que dificilmente ficaria melhor entregue. Da segunda vez, chorei porque tive de a deixar num ambiente novo, mais uma vez sem que ela percebesse porquê, mas com confiança em quem ficava com ela. Com a certeza de que teria toda a atenção do mundo.
Hoje chorei porque a deixei num mundo muito diferente do que ela conhece. Com pessoas que ela não conhece e que eu não conheço. Porque sei (desconfio, vá) que ali não terá a mesma atenção e o mesmo carinho a que está habituada. Porque haverá decerto miúdos e miúdas estúpidos que a farão sofrer. Porque não tenho a certeza se as pessoas que lá estão têm a capacidade, ou mesmo o interesse, de a acompanhar como eu gostaria.
Provavelmente, doeu-me mais a mim do que lhe doeu a ela. Que ficou com a certeza de ter à sua espera um mundo novo, de aprendizagem e conhecimento.
Sou assim, eu. Firme e hirta quando a situação o exige. Mas desmorono mais depressa que um castelo de cartas no segundo em que a minha força já não é necessária. Tive vontade de pegar nela e ir a correr para a escola antiga. Pedir desculpa por chegar assim, sem avisar, dias depois de já terem começado o trabalho.
Mas não podemos, pois não? Não podemos andar com eles ao colo a vida inteira. Não podemos evitar os sofrimentos e os perigos que, se tudo correr bem, servirão apenas para os fazer crescer mais fortes e mais conscientes.
Não me contive, e chorei ao telefone com o meu marido, que estará também ansioso, mas que tem de trabalhar e não precisava de uma maria-maluca a destabilizar-lhe a cabeça. E chorei depois com o meu próprio Pai, que me perguntou "queres que vá aí?". E ser pai e mãe é isto mesmo. É não poder evitar o sofrimento, mas minimizá-lo um bocadinho com a presença. Mesmo quando temos quase 40 anos.
Hoje começa uma nova etapa para todos nós. E eu sei que será uma etapa maravilhosa, de crescimento, de conhecimento, de novos amigos.
Agora já passou, não vou chorar mais (se bem que ainda não falei com a minha mãe, o que eleva em muito o risco das lágrimas me voltarem a torvar os olhos...).
É o coração. É o coração de Mãe que nos deixa assim, parvas.
quinta-feira, 5 de setembro de 2013
Back to Life
E pronto. Depois de uns longos meses de férias, é tempo de voltar ao trabalho.
Esta vida de dondoca é boa, mas tem os seus limites. Logo para começar tem limites monetários, o que é um grande aborrecimento. E depois tem limites cerebrais. Que estas celulazinhas cinzentas andam a dizer-me que estão a ficar perras e precisam de exercício. Elas e eu, que também tenho de me começar a mexer, sob pena de ter de renovar todo o meu guarda-roupa.
Sucede, por isso, que a afamada rentrée de Setembro verá também a luz do dia por aqui. E quando me refiro a "aqui", refiro-me a aqui no blogue, óptimo local para treinar estas coisas da escrita. Para pôr os dedos a mexer no teclado, para criar o hábito e a rotina de escrever todos os dias um bocadinho. Refiro-me também a aqui no "aqui há estória", que às ideias não serve apenas serem boas, têm de ser concretizadas.
O problema com o blogue, é que eu só tenho por hábito escrever quando há de facto alguma coisa interessante para dizer, ou quando o texto que me surge na cabeça me parece valer a pena. Gostava que fosse um blogue de coisas sérias, de crónicas da vida. Mas nem sempre tenho tempo ou disposição para isso, e assim vão passando meses sem escrever uma linha.
Ora, pus-me a pensar: muitos dos blogs que eu conheço falam de tudo. Da comida que compraram para o cão, às papas da criancinha, aos temas do país. E, de quando em vez, lá surge alguma coisa que vale a pena ler. Isso significa que as pessoas encaram o blogue como um diário, mais do que qualquer outra coisa. E isso faz sentido.
Não quero com isto dizer que vou passar a relatar a minha vida. Gosto, aliás, muito pouco, que saibam da minha vida. Mas vou escrever o que me apetecer. Apesar de poder ser lido por mais pessoas, vou escrever como se fosse para mim. Isso vai dar-me alento para a escrita e vai obrigar-me a ter uma rotina e a pôr os neurónios a mexer.
Por hoje era só isto. Um bom (re)começo para todos!
Esta vida de dondoca é boa, mas tem os seus limites. Logo para começar tem limites monetários, o que é um grande aborrecimento. E depois tem limites cerebrais. Que estas celulazinhas cinzentas andam a dizer-me que estão a ficar perras e precisam de exercício. Elas e eu, que também tenho de me começar a mexer, sob pena de ter de renovar todo o meu guarda-roupa.
Sucede, por isso, que a afamada rentrée de Setembro verá também a luz do dia por aqui. E quando me refiro a "aqui", refiro-me a aqui no blogue, óptimo local para treinar estas coisas da escrita. Para pôr os dedos a mexer no teclado, para criar o hábito e a rotina de escrever todos os dias um bocadinho. Refiro-me também a aqui no "aqui há estória", que às ideias não serve apenas serem boas, têm de ser concretizadas.
O problema com o blogue, é que eu só tenho por hábito escrever quando há de facto alguma coisa interessante para dizer, ou quando o texto que me surge na cabeça me parece valer a pena. Gostava que fosse um blogue de coisas sérias, de crónicas da vida. Mas nem sempre tenho tempo ou disposição para isso, e assim vão passando meses sem escrever uma linha.
Ora, pus-me a pensar: muitos dos blogs que eu conheço falam de tudo. Da comida que compraram para o cão, às papas da criancinha, aos temas do país. E, de quando em vez, lá surge alguma coisa que vale a pena ler. Isso significa que as pessoas encaram o blogue como um diário, mais do que qualquer outra coisa. E isso faz sentido.
Não quero com isto dizer que vou passar a relatar a minha vida. Gosto, aliás, muito pouco, que saibam da minha vida. Mas vou escrever o que me apetecer. Apesar de poder ser lido por mais pessoas, vou escrever como se fosse para mim. Isso vai dar-me alento para a escrita e vai obrigar-me a ter uma rotina e a pôr os neurónios a mexer.
Por hoje era só isto. Um bom (re)começo para todos!
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