À espera do dia em que, permanecendo o corpo, o ar que o envolve deixará de ter importância.
Da hora, em que os poucos movimentos que ainda restam, deixarão de existir para sempre.
Em que ficará apenas a memória do que foi.
E a poltrona, ocupada durante meses por um corpo quase inerte, ficará vazia.
Resta pouco daquilo que conhecemos.
Os olhos estão naturalmente lá. Mas dentro têm tão pouco que é quase nada.
Existem ainda as memórias. Ficando a dúvida se serão as memórias reais ou as imaginadas.
Realidades que não existindo, atraiçoaram a própria existência.
São praticamente 40 anos. Praticamente, porque falta muito pouco para que o sejam mesmo. Mas a contagem torna-se irrelevante, quando à história pouco mais haverá para acrescentar.
Apetece-me perguntar outra vez porquê. Mas teria como resposta as mesma duas palavras de antes: não sei. Em tempos o porquê teria sido uma libertação. Hoje não passaria de um capricho. E os caprichos, perante a perda da existência, revelam-se ainda mais insignificantes.
Pagamos, todos nós, em alguma altura, os nossos pecados. Mas haverá decerto preços demasiado altos. E este, há muito que ganhou contornos de castigo.
Sentado, à espera.
O que passará pela cabeça de alguém, que não tem mais por que ansiar do que o dia em que o fim pode ser o melhor dos desfechos?
E sabemos, sabemos com toda a certeza que fizemos sempre menos do que podíamos, demos sempre menos do que devíamos e perdoámos sempre menos do que sentíamos.
Sabemos sempre muitas coisas. Mas são sempre muito poucas as que chegamos a perceber realmente.
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